sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Educação e multiculturalismo


Diário da educação

Há dois anos, André Gravatá, 23, Camila Piza, 32, Carla Mayumi, 43, e Eduardo Shimahara, 41, formavam o Coletivo Educ-ação. De idades e formações diferentes, os quatro partilhavam um sonho: descobrir, ao redor mundo, iniciativas inovadoras e espaços de aprendizagem em sintonia com os desafios do século XXI.
 
Movidos pela inquietação, eles embarcaram em uma viagem que ampliaria suas concepções e experiências a respeito de educação. No itinerário, escolas, comunidades de aprendizagem, cursos formais e não formais dos quatro cantos do mundo – Brasil, Argentina, Estados Unidos, Espanha, Suécia, Inglaterra, África do Sul, Índia e Indonésia. 
 
Assim nascia o livro Volta ao Mundo em 13 Escolas – Sinais do futuro no presente, disponível para download gratuito no site da organização e impresso com o apoio da Fundação Telefônica Vivo.

Salva pela dislexia

A inglesa Sally Gardner, 
autora do premiado Lua de Larvas, 
conta como 
o distúrbio que 
a excluiu da escola abriu a sua imaginação 
e, ironicamente, 
a aproximou 
da literatura.

“Para vocês, sonhadores, que foram deixados de lado na escola e jamais ganharam prêmios. Para vocês, a quem o amanhã pertencerá.” Impossível não pensar na menina disléxica, expulsa de diversas escolas por ser incapaz de ler e escrever, ao ler a dedicatória do livro Lua de Larvas (Editora WMF Martins Fontes, 2014), o mais recente trabalho da escritora inglesa Sally Gardner.
 
Diagnosticada com o distúrbio de aprendizagem quando tinha 12 anos e tendo aprendido a escrever apenas aos 14, Sally sabe muito bem das lacunas deixadas por um modelo de educação padronizado, voltado unicamente para a instrução. “A escola falhou completamente na minha educação, mas a dislexia foi uma janela para a minha imaginação. Passava o dia inventando histórias na minha cabeça”, conta.

Ciência da delinquência

Por Cinthia Rogrigues
Se dependesse da pesquisa acadêmica feita pela Universidade de São Paulo (USP) e instituições parceiras, a redução da maioridade penal não estaria em discussão. Pelo contrário, estariam sendo cobrados os direitos dos adolescentes infratores. Para Roberto da Silva, organizador do livro Ciência da Delinquência, que reúne artigos de pesquisadores de diversas áreas sobre o tema, falta informação qualificada e a academia deveria ser mais ouvida sobre o assunto.
A obra resgata que o primeiro pedido de redução da maioridade penal aconteceu em 1993, após o caso “Champinha”. Na época, o assassinato de um casal de namorados na Região Metropolitana de São Paulo com a participação de um adolescente de 16 anos chocou a opinião pública, estimulada pela ampla cobertura da mídia.
 

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Extermínio da população jovem negra" no Brasil

E

O remédio é brincar

Por Sérgio Rizzo
Quantas crianças de hoje, quando os pais lhes perguntam se querem brincar (em casa, na rua) ou ir até um shopping center, optam pela segunda alternativa? A julgar pelo número elevado de crianças em shoppings, principalmente nos fins de semana, inúmeras delas preferem circular por um lugar inteiramente pautado pelos valores da sociedade de consumo (todo fechado, com iluminação artificial) do que se entregar a outro modo, menos previsível e mais inventivo, de gastar (investir?) o tempo. Sem contar aquelas cujos pais nem mesmo cogitaram a primeira opção...
 
Quem associa lazer e tempo livre ao verbo consumir talvez reveja algumas de suas crenças e posturas ao ver o documentário brasileiro Tarja Branca – A revolução que faltava, que faz uma defesa eloquente da brincadeira – lúdica, descompromissada, criativa – não apenas na infância, mas também na vida adulta. Dezenas de entrevistados (entre eles os músicos Antonio Nóbrega e Wandi Doratiotto, e os escritores Braulio Tavares, colunista de Carta Fundamental, e Marcelino Freire) lembram, em seus depoimentos ao filme, o que a vida cotidiana perde ao se esquecer do que todos sabíamos muito bem quando éramos crianças.
 
Uma das perguntas-chave do documentário: saberão disso também as crianças de hoje, boa parte delas vivendo em centros urbanos voltados para o trabalho e o consumo? Dirigido por Cacau Rhoden e produzido pela Maria Farinha Filmes (a mesma de Criança, a Alma do NegócioMuito Além do Peso), Tarja Branca, cujo título refere-se a uma divertida “medicina psicolúdica”, proposta em um dos depoimentos – sugere, ao apresentar visões diversas sobre o tema, que a educação contemporânea se apropriou da brincadeira, sobretudo na escola, como um “conteúdo programático”. Tirou-lhe, portanto, o que havia de mais essencial, o improviso e a falta de regras, para cercá-la de planejamento e cuidados.
 
Como resultado dessa política, teríamos uma geração de crianças, especialmente das classes média e alta, que não foi devidamente apresentada ao universo brincante, ou à “linguagem do espontâneo, da alma”, como resume um dos entrevistados. Pais e professores tendem a extrair do filme reflexões sobre como se comportam em relação ao tema com seus filhos e alunos, mas a provocação de Rhoden pode despertar interesse também entre o público que não se encaixa em nenhum desses papéis, ao fazer um diagnóstico da sociedade de consumo, intolerante, em sua lógica perversa, com a cultura do ócio ou com o “ficar sem fazer nada”. 

//Edição N° 64


História dos jogos

Quem adentrar pela história da origem dos jogos e dos brinquedos certamente se deparará com algumas dificuldades, entre elas a falta de registros, a pobreza de informações e até mesmo a compreensão sobre o significado do termo. Nesse sentido é bom esclarecer qual é de fato o conceito que temos de jogo. Seria ele sinônimo de brincadeira? Quando e como se originou na história? Qual a sua importância do ponto de vista cultural? Qual o valor no processo de desenvolvimento e de socialização dos seres humanos?

Etimologicamente, o termo jogo advém do latim ludus, ludere, que designava movimentos rápidos, mas referia-se, também, à representação cênica, aos ritos de iniciação e aos jogos de azar. Com tantos significados e aplicado o termo em diferentes contextos, nesse particular tema de aula, a palavra jogo será utilizada como sinônimo de brincadeira, independentemente das tênues diferenças existentes entre eles. Por outro lado, brinquedos são objetos que servem de aporte para as brincadeiras.
 
 
Com tal perspectiva, neste tema de aula, consideramos o jogo como sendo um processo dialético caracterizado por uma ação tanto física quanto mental, que ocorre dentro dos limites de um determinado tempo e local, caracterizando-se por influenciar mudanças de comportamento similares às que ocorrem com o um pêndulo de um relógio. Jogar permite ir da alegria à tristeza, do modelo à fantasia, da liberdade à regra, da imitação à criatividade. Pode ou não ser enriquecido com brinquedos, mas essa não é a única condição para brincar.
 
Recuperar a história dos jogos consiste em trilhar pelos caminhos percorridos pela humanidade, observando seus contextos, entendendo a maneira de ser e estar presente no mundo em determinado momento. Entendendo que tais atividades nem sempre foram específicas de crianças ou de adultos, mas de todo o grupo social dentro do qual ocorriam as interações, a socialização, a aprendizagem dos costumes e as práticas religiosas e educacionais.

Como preparar melhor o professor? Pergunta a Rubem Alves

Rubem Alves: A alma de tudo é o professor. Não adianta programas novos, novas leis, se o professor tiver a cabeça velha. Em nosso modelo clássico, o professor é aquele que sabe a matéria. Ele vai cobrar a matéria. Esse modelo não funciona mais. O professor tem que ser aquele que pergunta, que está junto com os alunos. Não dá respostas, mas provoca os alunos para ver se eles pensam por conta própria.

A escola como único ambiente educacional e limitante ao aluno? Pergunta a Rubem Alves

Rubem Alves: Em São Paulo, há um exemplo típico disso: o projeto Aprendiz, do Gilberto Dimenstein. As crianças aprendem nas ruas, nas coisas que estão ao redor dela. Uma das razões para você ter escola é a razão administrativa. É um lugar onde você põe a carneirada toda e trabalha com todos eles ao mesmo tempo. Não é uma razão pedagógica. Agora se você quer aprender sobre a fazenda, tem que ir até lá, colocar a mão na terra, mexer com as plantas. É preciso ir ao lugar para conhecer, porque a escola, querendo ou não, é um ambiente artificial. A vida não está acontecendo lá.

Infância Roubada, crianças atingidas pela Ditadura Militar no Brasil

O livro reúne 44 testemunhos de filhos de presos políticos, perseguidos, assassinados e desaparecidos durante a ditadura civil-militar (1964-1985) no Brasil. Há, também, depoimentos das mães das crianças atingidas, com impressões sobre como viram a violência a qual seus filhos foram vitimados.

Trecho 
André tinha três anos. Priscila, dois. O ano era 1968. Mês de dezembro, 13, dia da promulgação do Ato Institucional nº 5. A casa onde moravam, em Pariconha, interior de Alagoas, foi cercada. Foram acordados por gritos e pancadas nas portas e janelas. A pontapés e golpes de fuzis, soldados arrombaram a porta. Encontraram duas mulheres, Maria Auxiliadora da Cunha Arantes e Rosemary Reis Teixeira, ambas militantes da organização Ação Popular, de resistência à ditadura civil-militar. Junto com elas, seus filhos: André e Priscila, filhos de Maria Auxiliadora. E Rita, filha de Rosemary, aos cinco. “Hoje eu diria que foi um filme de terror”, conta Rita de Cássia, funcionária pública que vive em Goiás.
Mães e filhos foram presos e ficaram detidos por cinco meses. Passaram pelo Dops de Maceió, pela Cadeia Pública, pela Escola de Aprendizes de Marinheiros e pelo Hospital da Polícia Militar. No pátio do hospital, em meio ao lixo, ratos enormes circulavam por entre pernas e braços de gesso, curativos, caixas usadas. Para atenuar a situação diante das crianças, as mães apelidaram os ratos de Jerry [personagem de animação da série estadunidense Tom & Jerry].

Certa vez, na Escola de Aprendizes de Marinheiros, onde estava presa, Maria Auxiliadora ouviu o seguinte do oficial do dia: “Estive conversando com minha esposa e como não temos filhos, resolvi pedir que a senhora me dê seu filho. Podemos criá-lo muito bem. Olhe bem para a senhora. Que futuro a senhora tem? Seu marido está preso, a senhora está presa, ninguém da sua família apareceu, não vai ter condição nenhuma de criar essa criança”. Hoje, 46 anos depois, André é doutorando em ciências do desporto, professor universitário e funcionário do Ministério do Esporte.